Palavra do Presidente

Licença-paternidade ainda é um direito grifado em vermelho

A 31ª edição do SBP AmamentAÇÃO nasce em um momento emblemático. A celebração do Agosto Dourado 2025 e da Semana Mundial do Aleitamento Materno (SMAM) é guiada pelo lema “Priorize a Amamentação: Crie Sistemas de Apoio Sustentáveis”. A frase reforça a necessidade de redes sólidas para os bebês e suas famílias, conectando a amamentação à saúde do planeta e às urgentes questões ambientais. Esse espírito de sustentabilidade ambiental e social também nos convida a ampliar o olhar para outro pilar da primeira infância: a participação paterna.

Ao escrever licença-paternidade, o corretor automático sublinha de vermelho, indicando que algo está errado. Ao clicar, vem a sugestão: licença-maternidade. Um detalhe sutil, que por pouco não passa despercebido. A previsão programada de texto expõe também a concepção de uma parcela importante da sociedade, que ainda acredita que o cuidado com a criança é dever exclusivo da mulher. Neste mês dedicado aos pais, é oportuno tecer um diálogo mais profundo sobre o papel paterno e os benefícios de uma paternidade mais afetiva, participativa e corresponsável.

Os desafios relacionados à redefinição do papel do pai na vida da criança são imensos. Afinal, por séculos, o homem foi tratado como coadjuvante, limitado à figura do provedor. No entanto, essa releitura é fundamental para avançarmos, tanto no fortalecimento dos vínculos entre pais e filhos quanto na ampliação de garantias, como a licença-paternidade, pilar dessa reconstrução social.

Se antes se acreditava que apenas a mãe, por amamentar, era importante nos primeiros meses de vida, hoje pesquisas mostram que a presença paterna contribui para o desenvolvimento cognitivo e emocional da criança e também para o sucesso da amamentação. Pais mais presentes tendem a apresentar menor nível de estresse e maior empatia.

Novas informações permitem novas concepções, entre elas a que se refere à ampliação da licença-paternidade, atualmente limitada a cinco dias. A proposta é estender esse período para, no mínimo, 30 dias, pois prazos menores não são suficientes para iniciar uma mudança cultural que aproxime, de fato, os pais do cuidado com os filhos. No Congresso Nacional, seguem em tramitação diversas propostas sobre o tema, com a promessa de unificação de mais de 50 projetos.

Recentemente, a Câmara dos Deputados aprovou regime de urgência para o projeto que prevê 15 dias de afastamento, sem prejuízo ao salário e com estabilidade no emprego de 30 dias após a licença. Já o Senado, por sua vez, discute uma proposta de 20 dias. Na verdade, ambas as casas legislativas correm para cumprir o prazo – já expirado – estabelecido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a regulamentação da licença-paternidade.

As discussões, marcadas por resistências, precisam ser embasadas em dados técnicos, que provam o quanto a presença do pai desde os primeiros dias de vida é benéfica para o futuro adulto, que crescerá mais confiante e saudável, e também para a economia. Neste sentido, a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) decidiu, acertadamente, encampar a defesa da licença-paternidade de, no mínimo, 30 dias. Período, defendido por várias organizações da sociedade civil, como a Coalização Licença Paternidade (CoPai).

Ao aderir à campanha, a SBP se coloca à disposição para oferecer aos parlamentares e a sociedade dados científicos, para que as decisões possam ser tomadas com segurança. O maior objetivo é promover o desenvolvimento saudável da criança, fortalecendo sua primeira rede de apoio: a família.

É importante frisar que o fortalecimento do vínculo paterno e, consequentemente, da família, não representa um risco para a economia. Pelo contrário. O clássico estudo conduzido pelo economista James Heckman demonstrou que, para cada dólar investido na primeira infância, há um retorno de sete dólares na idade adulta.

Esse retorno se dá pelo aumento da escolaridade, da produtividade e pela redução de gastos com reforço escolar, saúde e sistema penal. Ou seja, mesmo sem considerar aspectos como a diminuição da rotatividade nas empresas, que também gera custos, o estudo já evidencia que a ampliação da licença-paternidade é uma medida economicamente viável.

Apesar dos avanços no debate, o caminho para a aprovação da ampliação desse direito ainda parece ser árduo, tanto quanto foi, no passado, para garantir a licença-maternidade. Nesse cenário, articulação política, mobilização social e embasamento técnico são fundamentais para propor uma mudança gradual, responsável e necessária.

Afinal, a criança não é responsabilidade apenas da mãe. Embora as mulheres chefiem 52% dos lares brasileiros, o cuidado com a infância deve ser compromisso de toda a sociedade. O ato de cuidar precisa ser repensado. E, acima de tudo, compartilhado.

Dr. Edson Liberal

Presidente da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP)


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