Publicado/atualizado: novembro/2025
Dra. Vera Ferrari Rego Barros
Grupo de Trabalho de Saúde Mental
Porque nessa fase o cérebro ainda amadurece de forma desigual: a área que processa emoções se desenvolve antes daquela responsável pelo autocontrole e bom senso, e os hormônios e alterações do relógio biológico agravam essa instabilidade emocional. É preciso lembrar que o jovem está em um franco processo de construção de uma identidade, a partir de novos referenciais para além dos familiares, o que influencia o bem-estar mental. A exploração de valores e papéis sociais pode gerar ansiedade, porque exige que o jovem experimente diferentes grupos, estilos e crenças antes de se comprometer com um caminho. Essa experimentação pode trazer angústia (“quem sou eu de verdade?”) e medo de tomar decisões erradas que o afastem da aceitação social. Mas também fortalece o senso de si.
As transformações corporais aceleradas na puberdade geram insegurança, afetando a autoestima e a sensação de pertencimento, uma vez que os adolescentes estão deixando para trás o mundo conhecido da infância para entrar em um cenário totalmente novo. Embora desperte curiosidade e expectativas, isso também se mostra assustador e desafiador, porque o adolescente não sabe o que ele se tornará e se será aceito e aprovado pela família e pelo meio social. É preciso lembrar que não existe uma idade “certa” para o início da puberdade, pois ela é influenciada por diversos fatores, mas quando a maturação física ocorre fora do ritmo do grupo com o qual o adolescente convive, podem surgir sentimentos de diferença, exclusão social e solidão. Os adolescentes relatam vergonha, ansiedade, baixa autoestima e insatisfação com o corpo, intensificadas pela exposição a padrões de beleza e comparações com colegas, que são reforçadas pela pressão exercida pelas mídias e redes sociais ao disseminarem uma ilusão de perfeição que é inalcançável na vida real.
Comparar-se constantemente mina a autoconfiança e gera ansiedade social. É comum os adolescentes buscarem medir seu valor com base nos outros. Quando as referências vêm de perfis idealizados em redes sociais, o déficit percebido se amplia. Muitos adolescentes acreditam que todos os colegas são mais felizes, bonitos e realizados do que ele.
Irritabilidade e mau humor periódicos, desejo de privacidade ou isolamento social ocasional, ansiedade sobre aceitação social ou desempenho acadêmico, experimentação de identidade e reações emocionais mais intensas, desde que não atrapalhem suas atividades diárias.
Emoções costumam se equilibrar com o tempo, mas a atenção é necessária quando se tornam intensas e persistentes. Preocupações com provas e aceitação social são comuns, mas sinais como inquietação constante, dificuldade em relaxar e dores sem causa física merecem cuidado. A evasão de atividades prazerosas e ansiedade excessiva também indicam alerta, assim como mudanças extremas de sono ou apetite, e expressões de desesperança, que afetem a rotina escolar e social.
O apoio profissional torna-se essencial para garantir segurança e bem-estar. Ideias suicidas verbalizadas pedem uma intervenção imediata dos pais, que devem buscar avaliação com psicólogo ou psiquiatra. Acompanhar o tratamento é fundamental. Manter o diálogo aberto e ajustar as rotinas para apoiar as recomendações profissionais.
Autorregulação, empatia e tolerância à frustração são cruciais.
Autorregulação envolve reconhecer a emoção no corpo (tensão, batimento cardíaco) e aplicar técnicas para acalmá-la. Empatia permite compreender o outro sem julgamento, fortalecendo vínculos sociais. A tolerância à frustração impede decisões impulsivas quando algo não sai como esperado. Essas ferramentas ajudam o adolescente a reconhecer e regular estados emocionais, de forma independente.
Pais que cuidam da própria saúde mental fornecem exemplos práticos de enfrentamento. Se o pai ou a mãe lida de forma saudável com estresse (buscando apoio, praticando alguma atividade que traga bem-estar, seguindo terapia), o adolescente internaliza essas estratégias. Em contraste, adultos que reprimem emoções ou têm explosões frequentes podem ensinar padrões disfuncionais.
Um lar acolhedor cria segurança emocional e reduz riscos de transtornos. Pais presentes, que escutam sem emitir críticas e validam as emoções, oferecem um “porto seguro”. Esse vínculo de confiança funciona como “amortecedor” contra o estresse externo (escola, redes sociais, conflitos de amizade). Adolescentes com apoio familiar consistente têm menor incidência de depressão e comportamentos de risco. Boas práticas familiares incluem conversas sem celular, com escuta ativa, que envolve estar atentos às falas do adolescente, com interesse genuíno pelo que ele está comunicando, buscando compreendê-lo pelo seu ponto de vista, estimulando-o a expressar suas ideias. Realizar atividades em conjunto, sejam pequenos passeios, refeições conjuntas ou mesmo assistir às séries de interesse para os adolescentes.
Manter um diálogo constante sobre sentimentos, celebrar pequenos progressos e planejar estratégias conjuntas para situações de estresse ajuda a criar um ambiente de suporte contínuo.
Construir um ambiente familiar que favoreça o diálogo e o compartilhamento emocional começa na infância. É essencial estimular os filhos a expressarem pensamentos e sentimentos, criando vínculos seguros e duradouros. Na adolescência, esse processo se torna mais desafiador, pois os jovens enfrentam conflitos internos e questionam valores familiares. O silêncio e a resistência são comuns nessa fase, exigindo dos pais paciência e sensibilidade. Para apoiar o adolescente, é importante criar um espaço acolhedor, livre de julgamentos, onde todas as emoções sejam validadas. Ajudá-lo a identificar o que sente é um passo fundamental. Respeitar seu tempo e estar disponível sem pressionar fortalece a confiança. Conversas informais em momentos cotidianos podem facilitar a abertura. A presença constante dos pais, sem insistência, transmite segurança. Reforçar que ele não está sozinho é essencial para seu bem-estar emocional.
Proteger demais o adolescente reforça o medo; em vez disso, é mais eficaz encorajá-los a testar, gradualmente, situações temidas, estimulando o enfrentamento e reduzindo a preocupação de forma prática. Oferecer suporte para que o jovem enfrente desafios gradualmente, como falar em público, situação comum no meio escolar, ou participar de eventos sociais. Evitar resolver problemas no lugar dele, em vez disso, perguntar: “como você acha que pode lidar com isso?” e deixar que desenvolva suas próprias soluções, transmitindo confiança na sua capacidade. É importante incentivar projetos de autoconhecimento, oferecer espaços para diálogo sem pressão por resultado, por “acertar” de primeira, e apoiar escolhas feitas pelos jovens, seja de atividades, hobbies, esportes ou outras, sem rotulá-las como boas ou ruins, mas atentos para o bem-estar e a segurança, que devem estar sempre presentes em sua rotina de vida.
Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) é um conjunto de serviços e equipamentos integrados ao SUS que oferece atendimento gratuito em unidades de saúde de todo o país. Agrega Unidades Básicas de Saúde/ Estratégia de Saúde da Família (UBS/ESF), Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), Unidades de Pronto Atendimento (UPA) e Centros de Convivência e Cultura
Mapa de Saúde Mental: o site https://mapasaudemental.com.br traz mapas com unidades de saúde e iniciativas gratuitas de atendimento psicológico presencial e online.
Canal Pode Falar: Iniciativa criada pelo UNICEF para oferecer escuta para adolescentes e jovens de 13 a 24 anos. O contato pode ser feito pelo WhatsApp – http//bit.ly/3K486Hw, de 2ª a 6ª feira, das 8 às 22hs.
Verifique, também, se a escola do seu filho dispõe de serviços de aconselhamento psicológico.