Investir em produção científica é fundamental, destaca o pediatra dr. Nelson Rosário

Com uma produção acadêmica de mais de 450 trabalhos publicados ao longo de 40 anos de carreira – sendo 25 artigos somente neste ano – dr. Nelson Rosário, defende que, quanto mais científica for a atuação e posicionamento do pediatra, mais diferenciado e apreciado será o seu trabalho. “Alguns médicos desenvolvem habilidades clínicas e outros de pesquisa”, destaca. Até o momento, pelo menos 45 trabalhos de sua autoria foram publicados no Jornal da Pediatria (JPed), reforçando sua ligação com a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). 

Em seu primeiro trabalho, “Sensibilidade ao Dermatophagoides farinae em crianças atópicas”, publicado no Jornal de Pediatria (JPed), em 1981, ele mostrou pela primeira vez no Brasil a importância alergênica dos ácaros da poeira doméstica. Em entrevista ao Portal da SBP, o pediatra, pesquisador e professor titular da Universidade Federal do Paraná (UFPR) afirma que o Brasil precisa investir mais em pesquisas. Com o tempo, disse, esses incentivos podem alavancar de forma efetiva a produção científica nacional, beneficiando toda a sociedade.

Portal da SBP: Como é ser pediatra, professor e pesquisador?

Dr. Nélson Rosário: As três atividades estão relacionadas entre si. O pediatra naturalmente é professor, pois ensina aos familiares de seus pacientes como eles devem conduzir nos momentos críticos de doença nas crianças. Cada uma dessas atividades profissionais pode ser desenvolvida de maneira integrada, mas para o pediatra predomina a atividade de assistência médica e a pesquisa apenas quando ele dispõe de recursos laboratoriais. 

Portal da SBP: O senhor foi autor e coautor de 25 artigos em 2021, tendo completado 450 artigos publicados em 40 anos de carreira acadêmica. Dentre eles, 45 trabalhos foram publicados no Jornal de Pediatria. Poderia comentar sobre sua produção científica?

NR: Curiosamente, 10% da produção científica foi publicada no Jornal de Pediatria, que é um ambiente próprio para o pediatra interagir com os leitores da revista, divulgando seu trabalho e propondo inovações na conduta médica. Cito dois exemplos: minha primeira publicação no JPed foi em 1981, na qual mostramos originalmente a sensibilização aos ácaros da poeira em crianças atópicas brasileiras, fato recém-conhecido em asmáticos adultos na época. Também cito outra investigação clínica, com a primeira descrição de casos de alergia ao pólen de gramíneas em crianças no Brasil, destacando para pediatras e alergistas como diagnosticar a rinoconjuntivite alérgica sazonal em crianças.

Portal da SBP: Quais as dificuldades e desafios na pesquisa científica no Brasil na atualidade?

NR: A dificuldade está na carência de recursos destinados à pesquisa em instituições de ensino com cursos de pós-graduação. Além disso, a distribuição de bolsas para alunos de pós-graduação não é homogênea entre as diferentes áreas. O avanço tecnológico colocou mais um obstáculo à criação e manutenção de laboratórios de pesquisa.

Portal da SBP: A cultura de publicação não é tão forte entre os países latino-americanos, incluindo o Brasil. Publicar artigos científicos é atividade fundamental para o pesquisador, médico e comunidade acadêmica? Por quê?

NR: A cultura de publicação tem que começar com alunos da graduação, que devem ser motivados a publicar seus TCCs, e na pós-graduação, com a publicação de teses e dissertações. Cabe ao professor identificar essa habilidade em seus alunos e despertar para a pesquisa e redação de artigos. Na vida acadêmica, a publicação é fundamental para divulgar o conhecimento entre pares e também entre clínicos não pesquisadores.

Portal da SBP: Fomentado quase sempre apenas nas pós-graduações, em mestrados e doutorados, o estudo científico não costuma chamar a atenção dos médicos quando ainda estudantes nas faculdades de medicina. Consequentemente, com menos especialistas interessados pela pesquisa, o Brasil acaba produzindo poucas publicações e inovações. Poderia falar sobre isso?

NR: Aos professores cabe estimular seus alunos de graduação para a pesquisa e publicação de seus resultados. A informação pode ser utilizada na inovação de procedimentos e tratamentos de doenças pediátricas.

Portal da SBP: O que o senhor considera que pode ser feito para aumentar o interesse do médico nesse segmento, bem como o número de trabalhos publicados na área de pediatria?

NR: Há médicos que desenvolvem habilidades clínicas e outros de pesquisa. É difícil conciliar todas as habilidades em um profissional.

Portal da SBP: Qual o papel da SBP no que tange à valorização da pesquisa?

NR: Acredito que SBP tem duas publicações fundamentais: Jornal de Pediatria, indexado e com fator de impacto de 2,197 para alcance de pesquisadores globalmente; e a Residência Pediátrica, com numerosos acessos em que residentes podem publicar sua experiência com casos bem estudados.