Relação entre autismo e alergia é tema de novo documento científico da SBP

Documento divulgado nesta segunda-feira (28) pela Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) promove um interessante debate sobre a relação entre a alergia alimentar e Transtorno do Espectro Autista (TEA). O texto, elaborado pelo Departamento Científico de Alergia faz uma síntese sobre recentes trabalhos desenvolvidos ao redor do mundo que propõem o estudo das interações entre cérebro e trato digestório, em especial no que se refere a pacientes com TEA.

Contudo, apesar de existir nestes pacientes uma associação frequente (até 91%) de sintomas gastrintestinais, como constipação, diarreia, distensão gasosa e dor abdominal, e prevalência elevada de manifestações alérgicas (respiratória e/ou alimentar) e autoimunes em pacientes com TEA foi descrita, o tema é controverso, pois esta relação não tem sido confirmada em outros estudos e em revisões sistemáticas e metanálises.

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INTERFERÊNCIA - De acordo com o Departamento, alterações da microbiota têm sido implicadas na gênese de doenças inflamatórias, alérgicas, autoimunes e câncer. O texto reconhece a interferência do padrão alimentar na composição da microbiota intestinal e ressalta que o aleitamento materno representa um padrão de excelência.  

“Uma alimentação rica em fibras (carboidratos complexos – ácidos graxos cadeia curta – SCFA/ butirato) e polifenóis (grãos, uvas, berries, cacau) está relacionada a uma microbiota de composição mais adequada, enquanto uma alimentação pobre em fibras e rica em carboidratos simples e oligossacarídeos, rica em carne vermelha e processada, rica em gorduras (total e saturadas) está relacionada à disbiose”, informa o documento.  

Os pesquisados alertam ainda para o crescente interesse, nas últimas décadas, pelo eixo intestino-cérebro (EIC) em que estão envolvidos os sistemas nervoso, endócrino e imunológico, em canais de comunicação múltiplos, complexos e bidirecionais. O texto informa que, mais recentemente, a microbiota intestinal foi incluída no conceito de EIC, que passou a ser denominado eixo microbiota-intestino-cérebro.   

COMUNICAÇÃO - Uma comunicação complexa e bidirecional no contexto deste eixo parece apresentar um papel na homeostase gastrintestinal a partir do cérebro, assim como uma interferência do trato gastrintestinal e sua microbiota no desenvolvimento e função do sistema nervoso central, incluindo funções afetivas e cognitivas.  

"De maneira que, doenças neuro-degenerativas, transtornos psiquiátricos tais como ansiedade, depressão e transtorno do espectro autista (TEA) vêm sendo relacionados a alterações da microbiota intestinal e processo inflamatório”, ressalta o documento da SBP. O TEA é composto por um grupo de condições heterogêneas que afetam o desenvolvimento neurológico e nos quais há sintomas que se manifestam precocemente e que são caracterizados por deficiências na comunicação e interação social e padrões restritivos e repetitivos de interesses, comportamento e atividades.  

O texto destaca que essa patogênese não é completamente conhecida e que estudos sobre a relevância do eixo microbiota-intestino-cérebro na fisiopatogenia dos TEA têm sido realizados, assim como sobre a interferência da alimentação no funcionamento do eixo EIC.   

HÁBITO ALIMENTAR - “Um aspecto bem conhecido em pacientes com espectro autista são as alterações no hábito alimentar, sendo descritos desde aversão, seletividade até a recusa total de determinados alimentos e comportamentos obsessivos disfuncionais, além de efeitos adversos de alguns medicamentos como redução do apetite”, esclarece o Departamento.  

A produção desse texto foi feita pelo Departamento Científico de Alergia, presidido pelo dr Emanuel Cavalcanti Sarinho e secretariado pelo dr Herberto José Chong Neto. São membros do Conselho Científico dra Adriana Azoubel, dr Antônio Carlos Pastorino, dr Arnaldo Carlos Porto Neto, dr Fábio Chigres Kuschnir, dra Maria das Graças Nascimento Silva e dra Marisa Lages Ribeiro. Atuou como colaboradora a dra Ekaterini Goudoris, membro do Departamento Científico de Imunologia.