Pediatria na Atenção Primária

CARTA DE RECIFE (resumo)

A Sociedade Brasileira de Pediatria reitera a urgente necessidade da presença do Pediatra na Atenção Primária à Saúde para a qualificação do cuidado integral de crianças e adolescentes no SUS.

Apoiados pelas deliberações dos recentes fóruns de defesa da pediatria, realizados nas cinco regiões brasileiras, e pelo Conselho Superior da SBP, reunido nesta data em Recife, Pernambuco, vimos a público nos pronunciar.

Há pelo menos duas décadas, a SBP e suas Filiadas defendem a valorização do pediatra na Atenção Primária em Saúde (APS), considerando a importância do acompanhamento e da atenção à saúde prestados por este profissional às crianças e aos adolescentes, em todas as etapas do crescimento e desenvolvimento, sendo reconhecidos os aspectos técnico-científicos relacionados à abordagem integral e foco na família, na formação em pediatria.

O pediatra pode somar esforços na APS no sentido de planejar, programar e executar ações de promoção de saúde e prevenção de agravos na infância e adolescência, com intervenções voltadas à ampliação da resolutividade neste nível de atenção e contribuindo para a diminuição das internações por condições sensíveis à APS neste grupo etário, além da prevenção das doenças crônicas não transmissíveis e carga de doença futura, na população adulta.

Crianças e adolescentes não têm sido acompanhados na APS por pediatras, na maioria dos municípios brasileiros, no modelo da Estratégia de Saúde da Família (ESF). Entretanto, identificamos a necessidade urgente de proposições para ampliar a presença do pediatra em diferentes oportunidades de atuação junto às equipes de APS, na perspectiva da clínica ampliada, compondo equipes de atenção básica e em estratégias de apoio técnico diferenciado, mantendo-se a orientação comunitária atual, contextualizada aos diferentes cenários de território em saúde.

Existem no país mais 40 mil pediatras para 45 milhões de crianças e adolescentes, uma relação acima de países desenvolvidos. A SBP estima que, inicialmente, de 2 a 4 mil pediatras, poderiam atuar diretamente junto às equipes de APS, assim como nas equipes e-Multi, nos municípios ou consórcios intermunicipais, sendo esta distribuição equacionada de acordo com as condições locais de saúde e perfil da população.

A presença do pediatra não é para substituir outro profissional de equipes da ESF, mas sim para somar, a partir da premissa que, desta forma, possam ser alcançadas melhores condições e qualidade ao cuidado de crianças e adolescentes, neste nível de atenção, unindo esforços para o fortalecimento do SUS.

O SUS é um dos maiores e mais completos sistemas de saúde pública, sendo sua organização e importância reconhecidas internacionalmente. O Brasil é um país com imensas desigualdades. A saúde pública tem problemas crônicos como subfinanciamento. Entre os grupos sociais vulnerabilizados, crianças e adolescentes têm a saúde em situação de maior risco. Acrescente-se a esta situação a caracterização de uma transição epidemiológica que, na infância e adolescência, nos impõe desafios maiores.

O aumento da sobrevida de crianças com condições crônicas de saúde e a alta expectativa social na responsabilidade do SUS, frente às demandas de grupos com deficiências ou transtornos do desenvolvimento, indicam que o pediatra poderá atuar desde a APS, mitigando a sobrecarga de referências a outros especialistas, ao mesmo tempo que o cuidado se qualifica no ponto de coordenação da rede de atenção à saúde.

O artigo 227 da Constuição e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) privilegiam o melhor interesse da criança e do adolescente. A proteção integral com absoluta prioridade aos seus direitos fundamentais de saúde, alimentação, educação, entre outros, implicam o reconhecimento da condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento. Não se pode considerar natural que existam ao menos dois grupos diversos na população brasileira, um,majoritário, que não tem direito ao cuidado em saúde pelo pediatra e outro grupo que o tem.

Esperamos obter o apoio das famílias, dos gestores, representantes dos poderes executivo, legislativo e judiciário, dos pediatras e demais profissionais de saúde, na busca da garantia deste direito constitucional que há muito vem sendo negado às crianças e adolescentes brasileiros.

Recife, 14 de novembro de 2025.

SOCIEDADE BRASILEIRA DE PEDIATRIA (SBP)